quinta-feira, novembro 24, 2005

Janelas

quarta-feira, novembro 16, 2005

Escorpião

sexta-feira, novembro 11, 2005

No Procênio

Talvez eu não devesse tocar fogo no rabo do capeta

Talvez eu não devesse gorar os planos divinos e enrabar santos e anjos de uma vez

Talvez eu não devesse golpear com lâmina fina o ventre do céu

Talvez eu não devesse soltar minhas górgonas furiosas para o gol do desempate

Talvez eu não devesse esticar o arco até o limite da sorte e olhar no centro dos olhos da medusa antes do gozo

Talvez eu não devesse vomitar na catacrese e mandar o mecenas à merda

Talvez eu não devesse assumir minha insignificância, declarar os nós na garganta, peidar númenos pressupostos e guilhotinar o self control

Talvez eu não devesse inverter o espelho, quebrar a face branca e enrugada da moral e uivar para qualquer uma das luas de saturno

Talvez eu não devesse tocar blues e jazz no meu violão de oito cordas ou cantar com meu piano exageradamente bêbado

Talvez eu não devesse mumificar a musa e lamber estriquinina no fuzuê dessas tribos de geena

Talvez, quando eu estiver vencido esta parada

Tiver acertado o alvo

sóbrio de poesia

eu saia de cena

quarta-feira, novembro 09, 2005

porque animal também é deus


um dia inteiro na estrada vendo o horizonte longe pegando fogo em toda parte e mais outro dia inteiro na estrada sob chuva fina num cenário de cinza molhada. alice e eu caminhando lento de mãos dadas em dias compridos e noites de blues com o aço corropendo o aço. por isso havia poesia. porque há poesia mesmo quando o olhar é de aço, de blues ou de sangue. alice e eu caminhando na mata com lama até o joelho, mosquitos aos milhares e muito medo. porque havia poesia na pedra, no prédio, no peido e no caralho; como há poesia em qualquer fresta, há poesia em alice, há poesia no medo, no ventre, nos pelos, nos dentes; há poesia no escambal, muito mais poesia sob o sol na estrada ou na lâmina fria que talha a carne, nos olhos de alice ou na minha tara.

O Coisa Ruim











me querem manso

cordeiro

imaculado

sagrado

no festim dos canibais

me querem escravo

ordeiro

serviçal

salário apertado no bolso

cego mudo e boçal

me querem rato

acuado

rabo entre as pernas

medroso

um verme, pegajoso

mas eu sou osso

duro de roer

caroço

faca no pescoço

maremoto, tufão, furacão

mas eu sou cão

lato

mordo

arreganho os dentes

incito a revolta dos deuses

toco fogo na cidade

qual nero

devasso o lero lero

entro em campo

desempato

eu sou o que sangra

um poeta nato

Ademir Assunção

Poema de Ademir Assunção, do livro “Zona Banca”, Editora Altana, 1ª edição –2001, p 87.

quarta-feira, novembro 02, 2005

Pela longa noite a dentro








Conheço a fera que me persegue, no calcanhar. Sei todos os seus nomes, apelidos e signos. Sei que ela tem seus asseclas e lacaios sempre de plantão também no meu calcanhar. Como sei que todos são medíocres. Frangos e frangas de corte na sua utilidade funcional. Vítimas do medo. Insetos que procriam com o sangue de suas vítimas. Devotos de um deus chamado números na carteira, cuja meta é criar a exclusão e produzir muita merda pra vender embalada em tetra pak.

Talvez por isso, os melhores puxadores de saco.

Os gênios da evasão e da falácia.

Já vêm embalados em tetra pak brilhantes e coloridos.

Vêm de terno e gravata.

Com máscaras e plumas.

Em sacos de lixo.

Em novelas da tv.

Nos jornais e revistas.

Das escolas e das catedrais.

Dos palácios e das favelas.

Nas esquinas e nas florestas.

Sei tudo sobre a fera e seus cúmplices.

Aprendi levando porrada, incomodando a enciclopédia, conhecendo quem saca rápido no duelo contra os jagunços da fera ali, no mesmo lugar onde estão todas as vítimas, onde os inocentes e culpados se misturam, uns vigiando os outros.

Sei quem e o que enfrento

Mas não tenho pena dos que acreditam na aurora.

Nem dos que acreditam que um dia começará a cair as máscaras e a surgir triunfante, pelas esquinas, a poesia, enquanto “os inocentes se matam uns aos outros numa terra arrasada e o ar mal se respira na cidade em chamas”.

Quando tudo está irremediavelmente perdido,

To have to do.

Porque todos os dias ela vem fazer a sua coleta de sangue

enquanto choca mais uma ninhada

de vermes cibernéticos.

Usa métodos práticos, espalhando o vírus da ignorância com gases de carbono na atmosfera.

Conta com o melhor aliado: todo o tempo do mundo..

Por isso inventou o mito, o happy end através do consumo.

Por isso planta mentiras na ciência e na mídia.

E não dorme.

Foi ela quem inventou o inferno e o medo. Deus e o diabo.

Foi ela quem inventou a técnica e a competição, construiu monumentos de concreto e abismos de aço onde despeja os rebeldes, os gênios e os conscientes.

Vasculha finiestras antigas, sótãos e porões, avenidas e becos escuros e incorpora-se em quanquer idiota que encontra de rabo empinado.

Portanto, baby, você tem que fazer. Ainda assim, vai acabar se fodendo, de qualquer jeito. Pois de qualquer jeito ela vai reconhecer essa sua cara de tetracórnio rindo.

acima de tudo

acima de tudo
cruel é o tempo
pensar amanhã

canglores de metal
& medo
na véspera da rua

acima de tudo
cruel é o amor
que eu não consigo